No dia 20 de abril, o Hospital da Criança e Maternidade (HCM) de Rio Preto recebeu o Grupo Cooperativo Brasileiro Multi-institucional para o Tratamento de Extrofia de Bexiga pela Técnica de Kelly, método complexo que repara a má formação do aparelho gênito urinário. É a primeira vez que o grupo, reconhecido internacionalmente, realiza uma cirurgia na região noroeste paulista. A cirurgia foi realizada em um paciente de 10 meses que, após 1 mês de recuperação, recebeu alta no fim da tarde da última segunda-feira, 20.
A extrofia vesical, ou extrofia de bexiga, é uma má formação complexa da parede abdominal em que o órgão genital, a bexiga e a musculatura da parede abdominal estão abertas, explica o Dr. Flavio Menin, cirurgião pediátrico do HCM. “A extrofia de bexiga faz parte de um complexo de má formações da parede inferior do abdômen. É como se não tivesse ocorrido o fechamento completo da região inferior do abdome e pelve, assim o paciente nasce com a bexiga aberta além do afastamento dos ossos e musculatura desta região além do pênis ou clitóris. Então é uma má formação congênita muito rara e muito difícil de corrigir”, explica.
O cirurgião pediátrico explica ainda que estes pacientes não costumam apresentar anomalias de outros locais além da extrofia. “São pacientes neurologicamente normais que possuem uma má formação grave que necessitam de uma correção cirúrgica para terem continência urinária e um aspecto o mais próximo possível de uma pessoa sem esta anomalia. Além do aspecto estético, visto que a bexiga e a região íntima são “abertas”, temos que pensar na continência e no aspecto da função sexual no futuro”, finaliza.
A extrofia de bexiga é uma patologia rara, com incidência entre 1/30.000 a 1/50.000 e devido à falta de especialistas nesse tipo de cirurgia, foi criado o Cooperativo Brasileiro Multi-institucional, que pela técnica de Kelly já realizou cirurgias em 16 estados brasileiros e 2 internacionalmente. No HCM, o grupo realizou sua 106ª operação.
O cirurgião pediátrico e coordenador do grupo, Dr. Nicanor Macedo, explica que é a cirurgia pela técnica de Kelly é uma cirurgia complexa e delicada, levando em médica cerca de 10 horas de duração. “Essa não é uma cirurgia reconstrutora, é uma cirurgia construtora, porque a natureza começou e não finalizou. Então a gente vai construindo cada partezinha que o corpo humano tem e que as pessoas normalmente nem sabem que possuem”, diz.
Ele conta ainda que, por serem incontinentes, os pacientes com extrofia de bexiga são vítimas de preconceito do ponto de vista da sociedade, em razão do odor de quem usa fralda cronicamente, e que a cirurgia tem dado resultados excelentes na restauração da continência urinária.
“Com essa cirurgia estamos conseguindo ter resultados muito bons, fantásticos, pois conseguimos dar a capacidade de o paciente ser normal, ser normal é aquilo que a gente nem sabe que tem. Como no caso da urina, em que temos a capacidade de armazená-la e enviar uma mensagem ao cérebro quando devemos eliminá-la. É uma honra termos essa capacidade de aprender essa técnica e restaurar essa funcionalidade em nossos semelhantes. Nosso objetivo é ensinar, para que daqui a pouco, Rio Preto aprenda e ganhe sua autonomia para que as crianças dessa região sejam beneficiadas”, disse.
A coordenadora do Serviço de Cirurgia Pediátrica do HCM, Dra. Danielle Teixeira Ferdinando fala sobre a parceria do HCM com o cooperativo. “No HCM temos profissionais que fazem parte do grupo Kelly, que acompanham as discussões e fica ciente dos casos, mas nunca participamos de uma cirurgia do grupo. Entramos em contato com o Dr. Nicanor e passamos o caso do nosso paciente para ele, colocando nosso serviço a disposição para que o grupo viesse para realizar a cirurgia e eles aceitaram”, explica. “Para nós foi um prazer receber o grupo Kelly. Nosso hospital está sempre de portas abertas para novos conhecimentos e para que todo mundo cresça. A intenção do nosso serviço de cirurgia pediátrica é crescer sempre e trazer o que há de melhor para nossa população”, finaliza.
Conheça o caso
A autônoma Mariane Cristina Mazoco, de Catanduva, é mãe do paciente que passou pelo procedimento no HCM pelo método de Kelly. Ela conta que recebeu o diagnóstico da condição quando o filho Marcos José Aparecido Jacob nasceu e que desde então enfrentava dificuldades para encontrar um tratamento adequado. Antes de ser encaminhando ao HCM, Marcos realizou uma cirurgia de extrofia em outro serviço hospitalar, com outra técnica, mas com base nos resultados precisava ser submetido a um novo procedimento.
“Cada vez que eu ia ao médico, era um desânimo total. Ninguém sabia o que fazer com ele e qual cirurgia fazer ao certo. Mas quando conseguimos encaminhamento para o HCM, enfim tivemos todo o amparo. Os médicos me disseram que ainda não realizavam a cirurgia no hospital, mas que iriam contatar o Cooperativo Multi-institucional, que faz a cirurgia pelo método de Kelly, então eu senti novas esperanças. Em menos de 2 meses conseguimos marcar a operação”, relata.
O procedimento foi realizado no dia 20 de abril e a cirurgia levou cerca de 11 horas, sem intercorrências. Durante a alta, a mãe fala do alívio. “Ele está bem, graças a Deus! Praticamente já se recuperou da cirurgia. Foi tudo bem e ele já está conseguindo, assim, segurar um pouco mais o xixi, graças à Deus”, completa.